O Superior Tribunal de Justiça autorizou no último dia 05 de junho a retenção da Carteira Nacional de Habilitação-CNH do cidadão devedor como forma de obrigá-lo a quitar o débito. A decisão, pelo Ministro Luís Felipe Salomão, foi tomada no âmbito de uma ação de cobrança originária da Comarca de Sumaré/SP, referente a uma dívida de 16,8 mil reais. Naquela instância o juiz determinou apreensão de passaporte e CNH do devedor.
A decisão tomou por base nova disposição trazida pelo novo Código de Processo Civil, vigente desde março de 2016, que em seu art. 139, IV, prevê que o juiz poderá “determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”.
Em recurso ao STJ, foi determinada a devolução do passaporte por entender que a retenção do mesmo fere o direito de ir e vir do portador. Já em relação à CNH não houve o mesmo entendimento. Não impede o direito de ir e vir, mas tão somente a autorização para fazê-lo dirigindo veículo automotor, mas em nada sendo impedido de fazê-lo por outros meios.
O poder dado ao juiz pelo CPC, por sua vez, busca o combate à prática de devedores de esconder patrimônio para não arcar com as dívidas em execução, continuando assim a viver suas vidas de luxo a despeito do prejuízo alheio. A retenção de um documento, portanto, tende a desencorajá-lo a tal comportamento.
Convém pontuar, contudo, que tal retenção somente pode ocorrer no âmbito de uma ação judicial e, ainda que possa compor os pedidos do autor da ação, será uma decisão do juiz, observadas as particularidades do caso em concreto que esteja em julgamento.
Mas, em se tratando o devedor de profissional que dependa da CNH para o desempenho de suas atividades laborativas? Seria possível a aplicação da medida em comento? Vejamos. O próprio CPC em seu art. 833 enumera, dentre os bens pertencentes ao devedor, aqueles que não poderão ser alvo de execução (penhora) para o adimplemento de dívidas. Há um princípio de proteção nesta disposição que entende que mesmo ao devedor e, sobretudo, sua família deve haver limite ao poder estatal de buscar a reparação material deste perante credores.
São impenhoráveis, portanto, dentre outros bens, os que sejam necessários ao desempenho laboral do devedor. Nesse passo, é impenhorável, por exemplo, um automóvel utilizado no transporte profissional desempenhado pelo devedor.
Ademais, nos parece, portanto, que assim como está protegido o bem que o devedor utiliza para seu sustento e de sua prole, também o estará toda e qualquer ferramenta que sirva ao mesmo propósito. Neste caso, não entendemos haver razoabilidade na retenção da CNH de um devedor que a utilize profissionalmente e, ainda que venha a ocorrer, uma vez que cabeça de juiz é terra deveras desconhecida, há irrefutável base normativa para o devido combate.
Manuelito Reis Jr
Advogado, OAB/RJ nº 214.838