A mesma pandemia que deixou o taxista Fernando Santana (A-1142), de 55 anos, isolado dentro de casa, sem trabalhar, foi a que fez com que seu colega Moisés Souza (A-0792), 43, se deparasse com uma receita que não via há muito tempo.
Com o costume de aguardar clientes na fila de táxi do Shopping Barra, em Salvador – que estava fechado até o final de julho -, Fernando nem se deu ao trabalho de rodar pelas ruas da capital baiana em busca de potenciais clientes. As ruas estavam praticamente vazias. E o medo do novo coronavírus o assombrava.
“A gente já vinha fragilizado, aí o shopping fechou. E agora que reabriu tá praticamente vazio”, lamenta, com as mãos na cintura e olhando para uma das entradas do shopping, como quem aguarda alguém aparecer.
Moisés não sabe qual sensação é essa de Fernando. Enquanto os shoppings estavam fechados, os supermercados agregaram a demanda, com procura tanto por alimentos, quanto por eletrodomésticos e eletrônicos. Melhor para o taxista.
“A gente tava muito melhor na pandemia. Os mercados estavam lotados. Estamos perdendo agora, que os shoppings reabriram”, explica. Ele, que fica das 7h às 22h na fila de táxis do supermercado Extra, na Vasco da Gama, estima que aumentou a receita em 50%.
Anderson Carlos (A-6612), 43 anos, dá a resposta para saber lidar com essa felicidade em meio à tragédia, que agora vê a realidade bater à porta. “Tem que se virar pra compensar”, orienta, de dentro do táxi mesmo. Ele não pode perder tempo enquanto conversa. Já sai apressado para atender a um cliente que saiu do mercado com as mãos cheias de compras.
Mas, antes, um aviso: o poder público não o ajudou. Mesma impressão que Jorge Souza (A-5796), 46, tem durante a pandemia do novo coronavírus. Menos desanimado do que seu colega de fila, Fernando, mas tão indignado quanto, ele desabafa sobre a relação com os governos municipal e estadual.
“Só recebi uma parcela do auxílio municipal [R$ 270]. Depois, só deixaram pra quem tinha mais de 60. Estadual também não deu nada. Só teve o federal”, lembra.
Ganhando ou perdendo durante a tragédia na saúde pública, a condição do táxi para eles é algo em comum: “dá pra se virar”, define Jorge, enquanto sai, para, mais uma vez, abrir a porta para o passageiro e começar tudo de novo.